Contratos com empresas estrangeiras e a Cláusula de Eleição de Foro

Sabemos que faz parte do cotidiano de muitas empresas brasileiras de médio e grande porte a celebração de contratos de toda sorte com empresas estrangeiras. Dentre os contratos comumente avençados vemos os contratos de distribuição, de prestação de serviços, de transferência de tecnologia, joint venture, de franquia, de agência, entre tantos outros.

Um importante aspecto que deve ser levado em consideração durante as negociações e a redação desses contratos é a Cláusula de Eleição de Foro: essa escolha não deve se restringir meramente à uma opção entre o juízo arbitral e à jurisdição estatal.

Como em um casamento, as partes não devem contratar esperando pelo pior, por que haja uma desavença ou pelo término abrupto da relação contratual, porém é imprescindível que sejam tomadas as devidas precauções a fim de se proteger os interesses do cliente antes mesmo de haver a necessidade da busca pela tutela jurisdicional.

Nas hipóteses em que a lei não prescrever um determinado foro como obrigatório em decorrência do objeto da causa, os seguintes aspectos devem ser considerados no momento de negociação da referida Cláusula de Eleição de Foro: local de execução da obrigação, local da sede das partes, local onde as partes detêm os seus ativos, custos com custas judiciais/arbitrais, advogados brasileiros e/ou estrangeiros, peritos, e as regras processuais da câmara arbitral e/ou previstas na lei aplicável ao contrato em questão.

Ênfase deve ser dada ao local onde as partes detêm os seus ativos, pois eventual ação de execução poderá exigir a penhora de bens da parte inadimplente e a escolha por um foro que corresponda ao local onde os ativos se encontram pode facilitar a satisfação célere do crédito da parte prejudicada.

Na hipótese de escolha pela tutela do judiciário brasileiro, há que se mencionar a recente entrada em vigor da Lei nº 14.879/2024 que trouxe significativas alterações legislativas no que diz respeito à escolha do foro em relações contratuais:

“Altera a Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), para estabelecer que a eleição de foro deve guardar pertinência com o domicílio das partes ou com o local da obrigação e que o ajuizamento de ação em juízo aleatório constitui prática abusiva, passível de declinação de competência de ofício.”

Essa lei alterou o Art. 63 do Código de Processo Civil, incrementando um quinto parágrafo e alterando o §1, de forma a buscar erradicar o chamado “forum shopping”, prática segundo a qual as partes podiam escolher um foro aleatório, muitas vezes com o intuito de obter vantagens processuais. Limitando, em sua redação, que a escolha de foro somente seja válida caso tenha pertinência com o domicílio de uma das partes ou com o local do objeto do contrato, essa medida visa garantir maior isonomia entre as partes e evitar a proliferação de processos em locais que não guardam relação com a causa, sobrecarregando determinados juízos e prejudicando a celeridade processual.

A título exemplificativo, um contrato entre uma empresa brasileira sediada em Manaus, no estado do Amazonas, e uma empresa francesa para execução de uma obrigação no Chile poderia ter como foro eleito uma câmara arbitral, o juízo de Manaus, a justiça francesa (segundo as regras aplicáveis) ou a justiça chilena (a depender das regras aplicáveis), mas não poderia ter como foro eleito uma vara empresarial da capital do estado de São Paulo ou ter como foro o Distrito Federal.

Assim, é recomendável que contratos firmados antes da entrada em vigor da lei sejam revisados para que questionamentos posteriores pelo judiciário brasileiro sejam evitados e que novas contratações sejam realizadas em estrita observância às regras ora vigentes.

Por fim, cabe ressaltar que a nova lei supramencionada representa um importante avanço em direção a um processo civil mais justo e eficiente. Ao proibir o “forum shopping”, a lei busca garantir maior igualdade entre as partes e evitar a proliferação de processos em locais inadequados. No entanto, é preciso acompanhar seus efeitos práticos e realizar os ajustes necessários para garantir sua efetividade e evitar conflitos com outros sistemas de resolução de conflitos, como a arbitragem.